Avanço em alguns pontos, preocupação em outros. Embora o número de fumantes no país tenha diminuído, o brasileiro ainda se alimenta muito mal e pratica pouca atividade física. Maus hábitos que resultam em doenças crônicas não transmissíveis, como a diabetes, hipertensão e o câncer, responsáveis por 63% das mortes registradas no país. Estudo inédito divulgado ontem pelo Ministério da Saúde, em parceria com a Universidade de São Paulo (USP), traçou um raio-x dos costumes das pessoas que moram nas 26 capitais do país e no Distrito Federal. Foram analisados indicadores como tabagismo, excesso de peso, ocorrência de doenças e consumo de álcool, de frutas e de hortaliças. (veja o quadro).
O estudo, intitulado Sistema de Monitoramento de Fatores de Riscos e Proteção para Doenças Crônicas Não Transmissíveis (Vigitel), colocou o Distrito Federal em honroso primeiro lugar no quesito atividade física. Com 21,5% da população adulta se exercitando cinco ou mais vezes por semana, a capital derrubou mitos. Um deles é o do Rio de Janeiro, capital povoada por beldades onde reina o estilo de vida saudável e o culto à boa forma física, que, no estudo, aparece em 9ª posição, com 16,4%, junto à cidade de Campo Grande (MS). Para Carlos Monteiro, pesquisador da Faculdade de Saúde Pública da USP que coordenou o levantamento, o DF é um local privilegiado, com bons índices se comparados aos demais locais estudados.
Apesar da turma chegada ao esporte, há também no DF uma legião de pessoas que não fazem qualquer atividade física. Está em 4º lugar, com 32% da população, entre os maiores índices de sedentarismo. "Não só no DF. Esse foi um dado que nos surpreendeu. É assustador verificar que 30% da população de todas as capitais é totalmente inativa fisicamente", destaca Monteiro. Ele lembra que foram consideradas sedentárias pessoas que, nos últimos três meses, não haviam feito qualquer tipo de atividade, nem mesmo ir ao trabalho andando ou de bicicleta, exercitar-se enquanto arruma a própria casa, ou em função do tipo de profissão.
Os mais sedentários do ranking estão nas capitais nordestinas: Natal (RN) e João Pessoa (PB), com cerca de 35% da população que não faz atividade física alguma. A capital paraibana também ficou no topo da lista de obesidade: com taxa de 13,9%. Menos grave, o excesso de peso recorde, de 48,3%, foi no Rio de Janeiro. Em segundo lugar está Porto Alegre, onde 47,9% de adultos têm índice de massa corporal (obtido pelo peso dividido pelo quadrado da altura) igual ou acima de 25. Apesar do contingente em briga com a balança, a capital gaúcha é o local, segundo o estudo, onde mais se come frutas e hortaliças.
Bebida e cigarro
As contradições se repetem em outros quesitos. Salvador aparece no topo da lista dos que mais ingerem bebida alcóolica. No estudo, foi considerado consumo excessivo a ingestão de mais de cinco doses de bebida, se homem, em um único dia nos últimos três meses. Para as mulheres, o limite da normalidade era de quatro doses. A líder no critério etílico ficou em último lugar no ranking do tabagismo. Salvador é onde menos se fuma. Só 9,5% têm o hábito.
"O comportamento e o estilo de vida das pessoas têm muito a ver com a cultura local. Em determinados lugares, faz parte do dia-a-dia tomar bebida alcóolica. Já o cigarro, no mesmo lugar, pode não ser muito tolerado", diz o presidente da Associação Brasileira de Qualidade de Vida, Alberto Odaga. Médico, Odaga afirma que todas as variáveis analisadas no estudo precisam andar juntas. "O bem-estar de que tanto se fala não está em um ou outro fator. Além dos exames laboratoriais normais, é preciso pensar também na dimensão emocional, espiritual, profissional. Hoje, a maior dificuldade das pessoas está em harmonizar tudo isso", diz ele.
Nos cinco fatores de risco avaliados pela pesquisa, os homens estão em pior situação. Eles bebem quase duas vezes mais que as mulheres, fumam mais, são mais sedentários, comem pior e têm mais excesso de peso - item até alguns anos predominante na população feminina. "Fica fácil entender por que a expectativa de vida dos homens é de 10 anos a menos que a das mulheres", observa Monteiro. Outro dado curioso do estudo, que dividiu os resultados por idade, mostra que quanto mais o tempo passa, melhores hábitos as pessoas adquirem.
Josefina Resende de Almeida representa bem a população mais consciente. Adepta da atividade física há mais de 20 anos, a médica aposentada, hoje com 64, esbanja vitalidade. "Comecei a me exercitar porque havia muitos casos de diabetes na família. E nunca mais parei", conta. "Mesmo antes de me aposentar sempre encontrava tempo para praticar atividade física. Deixava de ir ao cinema, mas não deixava a saúde de lado", relata.
Os bons hábitos, no entanto, não são seguidos por todas as mulheres. Em Porto Alegre, elas fumam quase tanto quanto eles. Apenas entre as mulheres, o consumo de bebidas alcóolicas é maior em Belo Horizonte (13,2%), Salvador (13%) e Recife (12,1%). Quanto aos fatores de proteção, os homens são maioria entre os que mais praticam atividade física. A taxa é de 17,8% entre eles, e de 11,9%, no caso delas. Mas, no DF, 18,7% das mulheres malham - índice superior à taxa masculina geral.
É assustador verificar que 30% da população de todas as capitais é totalmente inativa fisicamente diz Carlos Monteiro, pesquisador.


Fonte: Correio Braziliense
15/03/2007 - Brasil