Todos os anos, ocorrem cerca de 1,4 milhão de abortos espontâneos e inseguros no Brasil, segundo estimativa da Organização Mundial de Saúde. Os inseguros, como são chamados aqueles realizados de forma clandestina, representam 85% dos casos quase 1,2 milhão , segundo o Ministério da Saúde. Dia 25, conforme mostrou O DIA, o ministro da Saúde, José Gomes Temporão, defendeu a realização de um plebiscito sobre a descriminalização do aborto.
"Nos países em que o aborto é legal, as mulheres recorrem a clínicas e hospitais com condições de atendimento, profissionais de competência técnica para a realização do procedimento, e o risco de vida é pequeno. Onde ele é ilegal, as mulheres recorrem a locais clandestinos, sem condições mínimas, e muitas morrem", afirma Maria José de Oliveira Araújo, coordenadora da área técnica da Saúde da Mulher do Ministério da Saúde.
O aborto é a quarta causa de morte materna no país perde apenas para hipertensão, hemorragias e infecções. Em 2005, os óbitos provocados por aborto representaram 12,6% das mortes por causas obstétricas. Foram 1.170 mortes maternas, 148 delas devido ao aborto.
"Esse número pode ser maior. A morte materna no Brasil tem subnotificação de 50%. Por exemplo, uma jovem de 18 anos que morreu por infecção generalizada pode ter sido vítima de infecção causada por um aborto clandestino", diz Maria José.
No Brasil, o aborto só é permitido quando a mulher é vítima de violência sexual ou está exposta a risco de vida. Mas, de acordo com o ministério, a curetagem técnica necessária quando o organismo da mulher não consegue expulsar todo o material resultante da gravidez interrompida é o segundo procedimento obstétrico mais praticado nas unidades de internação. Apenas os partos normais são mais numerosos.
Só no ano passado, 221.169 brasileiras foram internadas nas unidades públicas e conveniadas ao Sistema Único de Saúde (SUS) para serem submetidas a curetagens pósaborto, com o custo total de R$ 33,6 milhões. "Minha filha fez um aborto com uma curiosa (aborteira) e ficou mal, com muita hemorragia, que só foi interrompida quando ela foi atendida num hospital", diz D., moradora de Tijuca.
O problema é recorrente, segundo a médica Regina Coeli, que atende em unidades públicas do Rio. "Na semana passada, uma jovem chegou no hospital com septicemia, em estado muito grave, porque tinha feito um aborto com uma 'curiosa'. Ela foi operada e teve o útero retirado, caso contrário morreria", conta Regina. "Infelizmente, toda hora chegam jovens com hemorragias e infecções causadas por aborto", acrescenta.
Mulheres usam até arame para abortar
Sondas, talos de mamonas, agulhas de tricô e até arame são alguns dos mecanismos usados pelas 'curiosas' que fazem abortos em mulheres desesperadas para interromper a gravidez. Outras vezes, elas próprias introduzem produtos ácidos na vagina, o que provoca graves lesões e a morte, de acordo com os médicos.
"Temos mulheres pobres morrendo todos os dias. Muitas vezes elas recorrem a práticas abortivas impensáveis, que causam infecções sérias, hemorragias graves, podem provocar rompimento do útero e a morte", afirma o médico Fernando Guerra, do Instituto Fernandes Figueira, da Fiocruz. "Muitas chegam nas emergências e são mal tratadas pelos médicos, que percebem que elas provocaram o aborto e não concordam".
Várias mulheres usam ácidos ou outras substâncias que acreditam ser abortivas, mas não têm esse efeito. O consumo excessivo de chás também é freqüente. "Há casos de envenenamento por chás", lamenta Maria José.


Fonte: O Dia (RJ)
02/04/2007-Ciência e Saúde