Folha de S.Paulo
20/09/2006
Cotidiano
Idosos vivem mais e melhor, diz estudo
Apesar dos avanços, registrados de 1998 a 2003, maior parte da velhice dos brasileiros ainda é vivida sem qualidade

Trabalhos mostrados em encontro nacional de demógrafos discutem as condições de vida da população na 3ª idade

ANTÔNIO GOIS
ENVIADO ESPECIAL A CAXAMBU (MG)

O idoso brasileiro vive hoje mais e melhor do que em 1998, mas a maior parte de sua terceira idade será vivida sem qualidade. É isso que mostram estudos apresentados ontem no 15º Encontro Nacional de Estudos Populacionais, que ocorre nesta semana em Caxambu (MG).
Um deles é dos pesquisadores Mirela Camargos, Roberto Rodrigues e Carla Machado (todos da UFMG) e mostra que, apesar de avanços registrados de 1998 a 2003, a maior parte da velhice do brasileiro ainda é vivida sem qualidade.
Para chegar a essa conclusão, eles calcularam a expectativa de vida de homens e mulheres que chegaram aos 60 anos de idade. Para homens, essa expectativa aumentou de 18,5 anos a mais para 19,1, enquanto entre mulheres a variação foi de 21,3 para 22,1.
Isso não significa, porém, que esses idosos viverão todo esse período com qualidade de vida. Para tentar descobrir qual a expectativa de vida saudável, os pesquisadores levaram em conta no cálculo as respostas que os próprios idosos deram ao IBGE em 1998 e 2003 sobre seu estado de saúde.
Ao considerar esse indicador, a expectativa de vida saudável dos homens ficou em 2003 em 8,4 anos a mais, e a das mulheres, em 8,9. Nos dois casos, houve melhorias em comparação com 1998.
Ainda assim, a expectativa para 2003 era a de que a maior parte da vida dos brasileiros a partir dos 60 anos seria vivida sem qualidade (44% do tempo para homens e 41% para mulheres).
Os dados permitem concluir também que mulheres, apesar de viverem mais, o fazem em piores condições de saúde do que os homens.
Limitações e vantagens
Camargos, Rodrigues e Machado explicam que o fato de o indicador ser subjetivo (é o idoso quem avalia para o IBGE sua condição de saúde) traz algumas limitações e vantagens.
Uma das limitações é que isso torna mais difícil a comparação internacional, já que o método depende da condição que o próprio idoso tem de avaliar bem sua saúde. Por outro lado, ninguém melhor do que o próprio entrevistado para dizer se está se sentindo bem ou não.
A pesquisadora Maria Isabel Parahyba, do IBGE, apresentou estudo semelhante, em que mostra que, no mesmo período analisado pelos colegas da UFMG, houve uma diminuição na proporção de idosos que declararam ter dificuldade para caminhar cem metros. A pesquisa revela que aumentou a proporção de idosos que procuraram médicos de 1998 a 2003.
O dado parece contraditório, já que muitos pacientes procuram médicos quando estão doentes, mas a chave para entender a dicotomia está no trabalho de Marcelo Neri, da FGV, e Wagner Soares, da UFRJ.
Segundo o estudo, aumentou o percentual de idosos com planos de saúde. Isso indica que os brasileiros da terceira idade estão procurando mais os médicos porque têm mais acesso a eles, e não porque estão com saúde pior do que em 1998.
O encontro em Caxambu discute os desafios do Brasil levando em conta que, pelas projeções do IBGE, a parcela da população com mais de 60 será cada vez mais numerosa.
Transferência de renda
Entre os fatores apontados pelos pesquisadores para explicar a melhoria da condição de vida dos idosos está a criação ou ampliação de programas de transferência de renda voltados para essa população, como o Benefício de Prestação Continuada (de um salário mínimo) e as aposentadoria rurais.
O trabalho de Marcelo Neri e Wagner Soares mostra, por exemplo, que houve ganho nos rendimentos dos idosos mais pobres de 1998 a 2003, o que ajuda a explicar o maior acesso a planos de saúde privados.
Neri e Soares também não descartam melhorias na atenção a essa população no serviço de saúde público, já que, no período analisado, já estava em vigor a Política Nacional de Saúde do Idoso, aprovada em 1996.